quarta-feira, 2 de março de 2011

Acho que já nasceu a "geração dos pais de jovens licenciados e cheios de esperança".

Tenho um primo um pouco mais velho que eu, 56 anos. Carpinteiro há 44.
Feitas as contas, já com 12 anos trabalhava.
Dizer que é carpinteiro desde os 12 anos de idade é um exagero. Foi aprendiz. À moda antiga.
Fez a 2ª classe e o pai levou-o a uma oficina.
Começou por acartar madeira, separar madeira, emedar madeira, lixar madeira, e só depois de tratar a madeira por tu é que começou a cortar, afiar, colar e pregar. 
Aprendeu o nome de todas as ferramentas,  deu-lhes uso mesmo não sendo suas. Poliu-as, afiou-as e reparou-as como suas fossem.
-Muito ouvi, muito ralharam, muitos carolos e tabefes, muitos erros cometi, dizia-me ele com o olhar posto nas portas pré-fabricadas da minha sala.
Trabalhava pela sopa e escasso conduto que tia Maria levava à oficina quando o sol estava a pique.
E quando saía da oficina uma mesa ou aparador para cliente finório, lá caíam algumas moedas que nunca soube se eram pagamento ou gorjeta. Caía e pronto. Sempre eram umas moedas.
No dia que resolveu ser carpinteiro por conta própria, deu-lhe um nó na garganta e não conseguiu dizer nada.
- Não digas nada. Tinha que ser um dia, não? Antes de ires embora, não deixes de passar  pela cozinha. Tia Maria já tem guardado há algum tempo um pezinho de meia que te pertence.
-Só te peço que não a faças chorar. Mulher chorona é pior que um dia de trabalho! Vá! Vá lá e volta sempre que quiseres.
Sim senhor! Começar a  trabalhar aos 12 anos. - Escravatura! É o que era, dizem alguns sem pensar.
Já vos digo o que é escravizar.
 Escravizar é um sentado esperar por um licenciado, jovem e cheio de esperança e "oferecer-lhe uma oportunidade de ganhar vantagem competitiva" face aos outros licenciados, jovens e cheios de esperança que se oferecem a outros tantos sentados, para um "estágio não renumerado".
Aos Jovens até lhes parece bem. Pudera.
Quem lhes paga a roupa que lhes exigem para estar bem apresentados,
quem lhes paga as refeições para estarem com energia para lidar com clientes exigentes,
quem lhes paga o transporte para estarem a tempo e horas no "estágio não renumerado",
sãos os paizinhos dos jovens licenciados e cheios de esperança.
E é pena que a senhora Fátima Campos Ferreira não tenha convidado alguns desses pais de jovens licenciados e cheios de esperança para o debate da passada segunda-feira!
Nota: As situações e personagens aqui retratadas são ficcionadas, com excepção dos sentados e dos jovens licenciados e cheios de esperança. Esses sim, são reais.
José Soluciolino

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